Foi como se tivesse estado fechada numa masmorra
Foi como se nunca tivesse sentido o calor do sol
Nem o cheiro do mar
Nem a brisa do fim de tarde
Foi como se nunca tivesse sentido a força de um beijo
Nem a ternura de um abraço
Nem o amor inteiro num olhar
Foi como se nunca tivesse vivido
Depois,
Num dia de Abril, revoltada tirei as algemas
Cortei as grilhetas e explodi
Na violência do acto não ficou pedra sobre pedra
Pude então ver o mundo inteiro como nunca tinha o visto
Pude então senti-lo, absorve-lo, bebe-lo,
Um mundo inteiro só meu, inteiro só meu
As pessoas e as coisas e o sol e o mar
Estava livre finalmente livre para poder sentir
Sem paredes feitas de preconceito e ideias feitas
Sem falsos pudores, sem críticas destrutivas
Estava livre finalmente para poder VIVER
Pela liberdade
Pela verdade
Pela seriedade
Pela serenidade
É por tudo isto que luto sem descanso
Com as armas erguidas e a voz gritante
É por ela que não me calo nem amanso
É uma busca sem tréguas, incessante
Liberdade, cálice sagrado da vida
Que todos buscamos intensamente
Andas por ai ligeiramente perdida
Mas nunca no coração de quem a sente
Eu sinto-a, e um dia completamente livre eu hei-de ser
Não tenho muitas armas para lutar
Mas tenho alma e sei escrever
E será sempre essa a arma que irei usar
Sei que sou apenas um grão de areia
Levado pelo vento num imenso deserto
Mas se houver um apenas que me leia
Então já valeu a pena por certo
Escreverei até ter feridas nos dedos
No papel gravarei um grito, um testemunho
Libertarei palavras, vitórias e medos
Um livro sempre, um livro sempre em punho
Foto de Rita Moreira
Abro as asas e deixo-me cair
No vazio, sem destino, a voar
Fecho os olhos para bem sentir
A brisa fina que me vem acarinhar
Voo livre pelo enorme céu aberto
Sem tecer mais pensamentos
E assim, nesse céu eu me liberto
De uma vida inteira de tormentos
Abro os olhos e vejo a imensidão
Da terra, do campo e do mar
A alma fremente de emoção
Saltita e não a consigo agarrar
Sinto o cheiro, a cor da natureza
E um sorriso abre-se em mim
Perante tanta e tão grande beleza
Ao ver o mundo pequeno assim
Voo no meio das árvores, das flores
Das abelhinhas e das mariposas
Com mil cheiros, com mil cores
Tantas coisas belas, maravilhosas
Feliz, de sorriso nos lábios, serena
Olhos abertos para tudo alcançar
Leve, mais leve do que uma pena
Pássaro eu quero para sempre ficar…